O luto não é silêncio

O luto não é silêncio, ele tem um jeito estranho de chegar. Ele não toca a campainha, não pede licença, não respeita calendário. Às vezes se anuncia com a brutalidade de uma notícia que despedaça o chão; outras vezes se insinua devagar, no silêncio de uma cadeira vazia à mesa ou no cheiro de café que, de repente, lembra alguém que não volta mais.

Perdi minha mãe há quatro anos. Achei que, com o tempo, a dor fosse se dissolver, como a espuma que se quebra na beira do mar. Mas não. Ela só mudou de forma. O que era um nó na garganta virou cicatriz. O que era grito virou silêncio. E nesse silêncio, aprendi a enxergar coisas que antes me escapavam: o peso de um abraço, a leveza de uma risada, o milagre que é estar vivo mais um dia.

Há pouco tempo, perdi também um amigo. E percebi que o luto não é um capítulo que se fecha, é um livro que a gente continua carregando, mesmo quando já não cabe na bolsa. Ele se instala, se rearranja, se mistura às páginas da nossa rotina e ali se faz presente. Não é ausência pura: é uma presença diferente, uma lembrança que insiste em permanecer, como se dissesse: “eu estive aqui, e continuo estando, de algum jeito”.

A terapia me ensinou a olhar para esse vazio com menos medo. Descobri que não existe certo ou errado no modo como cada um vive a saudade. Há dias em que ela é um peso nos ombros, e há dias em que ela é brisa. Há momentos em que me pergunto “como seria se eles ainda estivessem aqui?”, e há outros em que só agradeço por ter vivido o que vivi ao lado deles.

Uma vez ouvi que a saudade é como as ondas do mar: elas vem e vão, às vezes vem mais forte e outras vezes vem na calmaria de um simples dia ensolarado. Mas sempre está ali.

O luto me tornou mais atenta. Mais lenta, talvez. Ele me fez reparar nos detalhes pequenos: no som de uma chave girando na porta, no cuidado escondido num bilhete, na forma como a luz da tarde se deita sobre a mesa. É como se cada detalhe fosse um lembrete silencioso de que nada é garantido e, justamente por isso, tudo importa.

Talvez o luto seja menos sobre perder e mais sobre aprender a habitar o espaço vazio sem deixar que ele vire solidão. Talvez seja sobre reconhecer que o amor não desaparece; ele apenas muda de lugar, encontra outras formas de existir. Às vezes, ele se esconde numa fotografia antiga, às vezes numa música que volta de repente, às vezes na lembrança de um cheiro que parecia esquecido. Quando perdemos alguém tão próximo passamos a valorizar ainda mais as coisas simples e pequenas da vida.

No fundo, percebo que o luto não é silêncio. Ele é a voz do que amamos, ecoando dentro de nós.
E talvez seja justamente esse eco que nos faz perceber que cada despedida, por mais dolorida, também nos dá a chance de carregar um universo inteiro no coração.

💭 E você, quando pensa nas ausências da sua vida, o que elas continuam te dizendo em silêncio?

Próximo post

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Trending Posts

Sobre mim

Oie, meu nome é Ana Beatriz, tenho 26 anos e criei esse blog para compartilhar os pedaços que me moldam em universos inteiros. Este espaço não é um manual nem um palco. É mais como um caderno aberto, com rabiscos, pensamentos, e um pouco de poesia entre uma linha e outra.

Me siga ♥

A beleza da vida está nas páginas que lemos com o coração.

Categorias

Instagram

Edit Template

© 2025 by Universos Inteiros